Quando parece que tudo foi feito pra cansar e pra perder, eu sei que ainda tenho você. Perdido no tempo, no espaço, não mais do meu lado , mas sensação tua ainda se faz presente a cada novo dia. É como se você fosse uma parte boa de mim ,o chocolate mais doce da caixa. Meu passatempo preferido.
Fecho os olhos e apenas sorrio. Só lembro de coisas boas, de todo o legado que me deixou, todos os momento belos que apenas eu poderia viver ao teu lado, mais ninguém. Momentos doces, momentos de integral devoção. Sinto gratidão. Nunca poderia esquecer os mais belos olhos que já me sorriram em ato de dar amor e de não pedir nada em troca, de me fazer rir por horas a fio, de bobeira.
Éramos adolescentes. Vivendo o auge de nossas turbulentas emoções. períodos conflituosos, porém tínhamos sempre um ao outro. Uma brecha no tempo pra brincar de faz de contas, onde tudo é colorido e belo e permitido. Não era preciso pedir nem cobrar nada. A fidelidade era total, a recíproca verdadeira e o prazer descomunal. Descobrimos muitas coisas juntos. Aprendemos muito. E principalmente dividimos nosso melhor, um com o outro. Amizade transparente, amor em escala crescente.
Pego minha foto preferida sua, escondida debaixo do colchão mais velho e fedido da casa. Cheiro de mofo. Sorrio com ternura. Admiro cada traço de teu rosto, os olhos mansos, o sorriso tímido e por vezes sacana, quando soltava uma de suas gargalhadas alta e estridente. Teu carisma ainda consegue me emocionar.
A emoção chega novamente, como a maré. Ondas que vêm e se vão. Aprendi a lidar com elas. A cada nova onda que me chega, apenas aceito e mergulho a cabeça. Faz parte.
Ás vezes me faço perguntas, perguntas demais que creio eu ninguém saberia responder. Talvez até por não haver respostas. Nem deus, nem cartas, nem Freud, nem eu mesma. Fatos são fatos e acontecimentos são acontecimentos, e o fato é que te amei e te tive em minha vida, como um presente. Um presentinho que me arrancava risadas e me protegia da solidão
Fecho os olhos novamente, volto no tempo. Tardes ensolaradas a dois, tempo que passava preguiçosa e arrastadamente. Beatles, biscoitos, amoras no quintal.
Que saudade. Saudade de tudo que vivemos, do nosso amor, das minhas neuroses nada fundamentadas, das suas enchecões de saco e pequenas implicâncias. A gente se gostava e até hoje venho por meio desta humilde carta, deste livro que tento escrever, falar de você. Não só agradecer o imensa honra e sabor de ter tido você em minha vida, mas também pra compatilhar com os outros a pessoa que voce foi. Por orgulho e vaidade. Também pra dizer que você foi meu e que você foi e é lindo e de como me sinto novamente uma adolescente ao reviver tempos que não voltam mais, mas que ainda se fazem presentes. O que realmente importa o que realmente significa, não se perde. Deixa marcas no universo, se torna clássico.
Eu era uma menina. Uma menina comum. Vivia quase que intensamente a adolescencia de uma menina dos anos setenta. Ia fazer 18 anos e estava no ultimo ano da escola, pensando em prestar vestibular pra Letras. Gostava de ler, de escrever, era uma boa aluna em redação. Era apenas mais uma beatlemaníaca. Ouvir beatles era mais do que terapia, era religião. Tive meus momentos de rebeldia, de impaciencia com o mundo, de contestação, loucura solitária.
De vez em quando gostava de me vestir de preto, acendia velas no meu quarto e gostava de imaginar como seria melhor minha vida se eu tivesse poderes mágicos. Lia livros e achava que entendia de magia ou qualquer outra besteira. Rascunhava algumas coisas, queria ser escritora e meus textos até recebiam alguns elogios.
E eu vivia uma vida normal, tinha sonhos. E um dia o amor bateu à minha porta.
Engraçado que até hoje há pessoas que acreditam em alma gemea. Eu não acredito e nem nunca acreditei. Vivi o maior amor de todos os tempos, desde Romeo e Julieta até John e Yoko, e continuo achando besteira. Eu e Theo não fomos almas gemeas, fomos almas companheiras, amigos acima de tudo. A idealização do amor romântico acaba por pôr tudo a perder. Perde-se tempo em devaneios, em sonhos altos e nada concretos, em crises que não levam a nada. Relações são construídas aos poucos. Não existem caminhos, nem receitas. Criação mental.Algo próximo disso. Amizade e também respeito e também afinidades. Afinidade, sim, eu concodo , não se encontra em qualquer lugar, nem qualquer esquina.
Enfim. O amor me bateu a porta quase que literalmente e eu o aceitei.
Talismã da sorte. Preciosidade maior.
Era uma tarde de sexta-feira. A aula acabara mais cedo e então voltara pra casa.
Alguma excitação me tomou, sem eu saber exatamente como nem porquê.
Estava animada, afinal de contas sexta-feira é dia de sair, de varar madrugadas, beber cerveja e rir ao luar. Falar besteiras , chegar em casa fedendo a álcool e cigarros.
A lua estava cheia e bonita. Sendo eu uma típica canceriana sonhadora, sentia com alguma frequência a influência dela, a lua, em mim. Vivia de ciclos emocionais. Quando ela se encontra cheia até hoje me sinto mais agitada, mais faminta, como uma pequena loba louca buscando divertimentos.
Agora me veio uma neurose, devo compartilhá-la. Não sendo eu a maior escritora do mundo. talvez seja útil e necessário abrir pequenas brechas no andar do texto para que eu possa respirar, e explicar e conversar com você leitor que tem curiosidade em saber um pouco da minha vida.. e do amor mais lindo que eu já vivi. Quero dar ênfase a toda aquela emoção vivida, pois ela ainda é presente, ela ainda é forte. Eu a sinto agora. O amor é meu companheiro e não cabe no bolso. Quero escrever, compartilhar, enfeitar, quem sabe até aumentar.
Não quero parecer uma adolescente boba. Não sou mais. Nem quero que o meu relato do meu grande amor soe piegas, nem que perca sua importância ou respeito por parecer adolescente demais. Não fui adolescente demais. Fui adulta demais, corajosa demais. E é sempre bom nos vangloriar dos nossos feitos. E pra mim hoje, reescrever meu grande amor é experiência doce e açucarada. Meus olhos retomam o brilho e me sinto prosa. Pra quem não acredita no amor, se quebrou em mil pedacinhos ou ainda não encontrou a pessoa certa só tenho algo a dizer: para cada corpo há uma sombra. O amor não nos deixa na mão. Continue acreditando.
E então voltando.. Eu era adolescente e conheci Theo na noite daquela sexta-feira. Encontrei meus amigos na rua, como era costume todo fim de semana. A lua estava especialmente bonita, a harmonia era notável.
Os anos eram 70 e vivíamos uma efervescência cultural, muita música, muito rock e experimentações, buscas sem fim.
Uma pequena banda de jazz da cidade tocava como pano de fundo. Entrei no bar para pegar um cigarro quando avistei Theo pela primeira vez. O rosto me pareceu familiar. Estava bastante entretido com um pequeno grupo, discutiam filosofia, falavam alto e ele gesticulava demais. Senti uma aura de rebeldia ao mesmo tempo que um toque artístico. Uma aura de luz que irradia carisma, charme e virilidade. Minha atenção foi tomada por alguns segundos e eu não sei bem porquê. Não sei se os cabelos claros que reluziam luz, se o tom de voz meio rouco ou sua capacidade de se tornar centro das atenções. Ah os olhos.. como não comentar? Olhos claros, pequenos e rasgados..
Peguei meu cigarro e fui em direção ao banheiro.
Enquanto esperava mnha vez na fila, notei alguns olhares dele em para mim. Senti seu olhar em minha direção como um raio de luz energetico tentando adentrar um terreno desconhecido. Mera curiosidade. Quando notou meu olhar retribuindo proporcionalmente a mesma curiosidade, voltou sua atenção ao pequeno grupo que discutia filosofia. Olhando com mais atenção notei que na rodinha estava nada mais nada menos que Davi, um colega de escola muito do chato. A conversa parecia interessante, no entanto achei tudo bobo demais.De repente de filosofia, pularam para movimento punk. Pura gastação verborrágica.
No jukebox ao lado tocava Love me Do e eu saí do bar. Fui encontrar Karla e Katarina do lado de fora.
Encontrar minhas amigas era sempre um momento de alegria, prazer e contentamento. Com algumas outras meninas da escola eu nao tinha muita simpatia. Não gostavam muito de mim e nem eu fazia questao de agrada-las. Ter fama de antipática com um certo grupo de pessoas tinha lá suas vantagens e eu gostava disso. Tinha meu mundo particular, muito bem inventado, muito bem decorado, com muito bom gosto e lirismo. Sabia escolher muito bem minhas amizades. Karla e Katarina eram as melhores. Nos divertiamos muito sempre e sair com elas às sextas feiras já era quase que obrigação. É claro que não eram minhas únicas amigas e é claro que sempre que saíamos acabavamos encontrando outras pessoas que se agregavam à nossa roda de meninas doidas e quando bêbadas, desbocadas... porém quanto àquelas meninas da escola, num geral, eu ainda mantinha um certo distancimanto e ar de antipatia e frieza, e quem sabe até de superioridade.
Esta foi apenas mais um sexta-feira, comum, cíclica. Porém foi o dia que avistei pela primeira vez o Theo. Viver em cidade pequenas tem seus prós. Creio já ter o visto outras vezes, porém está foi a primeira vez que reparei mesmo nele com atenção plena e interesse. Olhos de perspicácia.
Um sentimento estranho então começou a brotar em mim. Aquela imagem no bar não me saía da cabeça. Foi então que passei a dormir e acordar com Theo em meus pensamentos, com certa frequência. Um sentimento de ternura tomara conta de mim, preocupação, proteção e encantamento.
Desejo. Eu não sabia o que queria, nunca havia vivido uma relação verdadeira com outro , mas sabia o que desejava. E continuava desejando aqueles olhos tão únicos, sem mesmo entender absolutamente a origem do desejo. Um pouco de filosofia nessas horas cai bem.
Cheguei a comentar por alto minha mais nova fixação com Karla. E foi então que ouvi alguns comentários de desaprovação:
A Maria conhece esse cara. Não me falou coisas lá muito legais. Rebeldia é seu nome. Estuda filosofia em outra cidade, mas sempre vem pra cá. Acho que a mãe mora aqui.
Um dia voltando sozinha da escola, quase chegando ao ponto de ônibus, me deparo com uma escrita em vermelho, uma pichação no muro. "Theo Peter Jones" e "Marginais extrapolam espaços e escrevem muito".
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